Gritos na trilha sonora

Por Patrick Holzapfel.

Cabe aqui uma observação preliminar: o fato de os distribuidores de filmes, que são tão ousados em suas por vezes imaginativas traduções para o alemão, evitarem o termo histórico "Interessengebiet" em favor de "Zone of Interest", o que soa mais como um emocionante filme de ficção científica para os ouvidos alemães, não passa de covardia orientada para o mercado (embora, no caso de Jonathan Glazer, todos os seus filmes anteriores tenham sido lançados nos cinemas com o título original em inglês). Assim fica mais fácil manter à distância a idílica agitação da casa nazista ao lado do campo de concentração de Auschwitz-Birkenau, pelo menos em teoria.

Como essa não é a única contradição do filme, que é dedicado exclusivamente aos perpetradores, não vamos nos deter nela por muito tempo. Há, por exemplo, a questão da adaptação. Aparentemente, como lemos nos créditos, o filme é baseado no romance homônimo do autor britânico Martin Amis. Entretanto, em seu polêmico trabalho apaixonado pela língua alemã em inglês, são descritas três diferentes perspectivas de homens fictícios que vivem em uma "Interessengebiet" semelhante ao campo de extermínio de Auschwitz, uma área restrita da SS. Um oficial, o comandante e um Kapo. O que é particularmente questionável na abordagem de Amis é sua maneira de lidar de forma acolhedora com o romantismo e, como é de seu costume, com a sexualidade explícita.

As fantasias masculinas à la Amis, de qualquer forma, fazem pouco esforço para alcançar a abstração sobre a qual Klaus Theweleit escreve em relação aos homens do fascismo. Há apenas uma cena de sexo no filme, entre Rudolf Höss e uma prisioneira, na qual depois ele constrangido lava seus órgãos genitais. O texto de Amis expressa uma consciência desenfreada, um fascínio sombrio, às vezes arrogante por parte do autor, mais interessante como literatura do que como um tratamento da história. Simultaneamente, porém, seu livro é obviamente o trabalho de um ser humano, enquanto no caso de Glazer há uma estranha distância entre o filme e seu tema. O que Glazer poderia ter tirado de Amis, além de algumas cenas como um diálogo entre pai e filha sobre escovar os dentes, é a literatura secundária, os textos biográficos e as declarações judiciais de Höß em particular.

Onde Amis é ofensivamente provocativo, Glazer se congela em escrúpulos paradoxais de representação. Pode-se certamente dar crédito a ele por isso, afinal, provavelmente não há assunto que exija cautela semelhante a um cineasta. Ao mesmo tempo, The Zone of Interest, em última análise, só acrescenta outra abordagem intelectualmente compreensível ao que Imre Kertész chama de estilização e falsificação do Holocausto a qual vem florescendo há décadas. De qualquer forma, Glazer se concentra na família Höß, especialmente em Hedwig, que cuida do jardim paradisíaco construído por ela ao lado do muro do campo, e em Rudolf, o comandante do campo de concentração de Auschwitz. Vemos a família conversando, nadando, remando, na estufa, à mesa, com convidados, um cotidiano. Fala-se da transferência de Höß para Berlim, possivelmente sobre o entrelaçamento de um aparato capitalista com o fascismo, mas isso já é uma interpretação. Glazer prefere nadar na ambiguidade, pois é mais seguro.

Não vemos nenhum prisioneiro, apenas uma vez os vislumbramos por trás da grama alta. Em vez disso, Glazer transfere o que acontece atrás do muro para a trilha sonora e para algumas nuvens de fumaça das chaminés e trens que surgem no horizonte. Se você preferir, The Zone of Interest é exatamente o oposto de Aufschub, de Harun Farocki. Som, cor, estilização e ilusão em vez de silêncio, dessaturação, análise e distância crítica. Usando até dez câmeras simultaneamente, Glazer tenta tornar visível a banalidade do mal descrita por Hannah Arendt na réplica da vila Höß, que fica a apenas alguns metros da original, com a ajuda de um conjunto liderado por Sandra Hüller e Christian Friedel. Ele se abstém de adotar uma posição clara sobre os eventos ou somente a encontrou na edição. O efeito desse método incomum de filmagem é, por um lado, uma inquietação que lembra os métodos de vigilância que permanecem nas imagens e, por outro, uma proximidade com o real que imita o documentário e, portanto, em terceiro lugar, uma contradição com a banalidade descrita por Arendt. Visto que a filósofa enfatizou que a banalidade não deve ser confundida com o cotidiano. O desapego dos criminosos à realidade não pode ser filmado, especialmente se for mostrado de maneira realista.

O que o filme afirma, como muitos discursos dos últimos anos, é uma espécie de soberania moral adquirida diante do incompreensível. Isso é revelado quando as crianças da família se trancam na estufa e, com isso, continuam o sadismo como um jogo. Revela-se quando a realidade do campo é sugerida em imagens invertidas, semelhantes a sonhos. Revela-se quando Höss abraça seu cavalo e, assim, representa o que Theweleit escreveu sobre o entrelaçamento da masculinidade e do fascismo. Revela-se quando a suposta normalidade descrita pelo próprio Höss é aceita e filmada com o aparecimento de pequenas rachaduras.

Com exceção de uma cena que cai fora do filme com closes das flores no jardim, depois da qual a tela fica vermelha e quase sufocamos com o som sibilante criado pelo compositor Mica Levi, bem como de uma sequência interessante no final do filme, quando Höß de repente parece olhar para um futuro em que as tropas de limpeza mantêm o Museu Estadual de Auschwitz-Birkenau, o filme omite a impotência que persiste até hoje. Ele não duvida, não se deixa abalar, dá a impressão de ter banido o nacional-socialismo e seus métodos. Essa certamente não é sua intenção, mas uma consequência da abordagem escolhida.

As imagens permanecem claras, calmas e históricas. As pessoas permanecem desumanamente humanas. Tanto faz. Elas representam várias figuras de culpa nacional ou humana. Na verdade, não são pessoas, permanecem figuras, ideias baseadas em análises teóricas e relatórios. Glazer não mostra para reconhecer ou superar algo, mas acaba permanecendo visualmente fascinado pelo incompreensível. O fato de alguém estar deitado ao sol em um jardim enquanto pessoas são baleadas e queimadas do outro lado do muro é motivo suficiente para que ele reconstrua uma casa no local, coloque chaminés digitais fumegantes, deixe que os gritos soem na trilha sonora, faça figurinos, traga os melhores atores alemães para o set e ligue a câmera. Como em tantos trabalhos artísticos anteriores, Holocausto é mais uma investigação detalhada das condições históricas e das possibilidades de representação do que um confronto real e atual com os eventos.

O fato de que a ênfase do filme em evitar a reapresentação da violência se aplica apenas ao nível visual, mas não ao nível sonoro, é no mínimo estranho. Não seria o som parte da representação, não seria seu design baseado em documentos sonoros históricos existentes, evocando imagens ainda mais explícitas do que seriam as imagens concretas, ponderadas e autoquestionadoras? De certa forma, The Zone of Interest segue os passos de László Nemes e seu Son of Saul, que usou o desfoque como um meio eloquente de supostamente não mostrar nada. É estranho que os cineastas, em particular, afirmem que o desfoque e o som não representam nada.

Mais produtiva é a sequência em que Glazer relaciona o trabalho de limpeza aparentemente mecânico no local do memorial em Oświęcim com processos semelhantes na casa dos Höß. Nesse ponto, o filme questiona a si mesmo, bem como a chamada cultura da lembrança que gira em torno dele e de seus métodos de trabalho. Não está claro o que exatamente se torna visível nessa sequência, mas algo se abre. Em uma época em que as últimas testemunhas estão morrendo, o cinema, em especial, precisa repensar sua relação com a não-repressão do Holocausto. The Zone of Interest quer ser um filme responsável que evita todos os erros já cometidos. No entanto, no fim das contas, ele apenas repete a tentativa de alcançar a soberania intelectual, que em sua essência carece acima de tudo de humanidade. Ou é proibido filmar o que é infelizmente desumano de uma forma humana? Provavelmente seria necessário definir com mais precisão o que seria essa humanidade, mas ela certamente pode ser encontrada em algum lugar onde não se consegue dizer uma palavra quando se percebe o que aconteceu nos campos de extermínio.

Schreie auf der Tonspur foi originalmente publicado na revista eletrônica Perlentaucher em 28 de fevereiro de 2024. Tradução: Ezequiel Antônio da Silva Stroisch.

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