Casa de Sudor y Lágrimas (2018) – A crença como ferramenta de privação dos corpos

A impressão era que todas as pessoas estavam sem ar quando as luzes da sala de cinema do Centro Integrado de Cultura (CIC) se acenderam, logo depois da exibição de Casa de Sudor y Lágrimas, longa-metragem espanhol selecionado para abrir a primeira edição do Floripa Que Horror. Entre outras questões levantadas pela obra, na noite desta quinta-feira (15), falou-se muito sobre a linha tênue que separa o fundamentalismo do fanatismo religioso.

(Imagem: Reprodução/Vimeo)

Em linhas gerais, o filme acompanha um grupo de cristãos radicais vivendo isolados em um prédio mal-acabado. Liderados por uma anciã, eles saem poucas vezes para passear a bordo de carros luxuosos, mas somente após serem vendados com máscaras por uma mulher bem vestida – o que contrasta com as vestes brancas usadas pelos membros do culto. Depois que a figura messiânica de um jovem integra-se a turma, as estruturas da seita são abaladas.

Não sabemos de onde eles vêm, nem para onde vão, tampouco conhecemos quais as verdadeiras relações desses indivíduos. Isso porque a diretora Sonia Escolano não se preocupa em mediar soluções imediatas para os conflitos que surgem no decorrer da trama. Ela parece estar mais interessada na vagarosa construção de um inflexível universo de concreto, claridade, sombras e sussurros.

(Imagem: Reprodução/Vimeo)

A austeridade de tal encenação julga abertamente a crença como uma ferramenta de privação de corpos e até mesmo consciências. Além de enfatizar como as relações dentro do grupo religioso são nocivas, uma vez que a hipocrisia sustentada por alguns membros os fazem viver pisando em ovos – melhor dizendo, em cacos de vidro. Nessa perspectiva, podemos considerar a cena do suicídio de Emma como o ponto-chave dessa reflexão.

Colocada logo depois de um falso e anticlimático exorcismo, a sequência em que Emma tira a própria vida pode ser torturante – assim como todo o resto da obra –, mas consegue passar uma estranha leveza se observamos como sendo a definitiva libertação da personagem. Uma vez que ela se vê à mercê dos símbolos estabelecidos pela religião, os quais aprisionam homem e espírito à valores morais radicalmente conservadores, resta apenas uma saída. Não à toa, no fim, Sophie livrará todos os outros fiéis antes de partir trajando as roupas do messias. 

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