Cineclube Sganzerla apresenta: Qual a Cor da Mentira?

Entre os dias 19 de outubro e 2 de novembro, o Cineclube Sganzerla apresentará ciclo de filmes cujas narrativas, que giram em torno do casamento, ressaltam a especificidade do cinema em espelhar as zonas acinzentadas do que é verdadeiro. A programação, intitulada Qual a Cor da Mentira?, é composta por títulos de cineastas como Claude Chabrol e Rainer Werner Fassbinder, além de uma sessão dupla dedicada a Joan Bennett, atriz de Fritz Lang, mas também de Jean Renoir.

Os encontros virtuais serão realizados via Google Meet, nos domingos 19 e 26 de outubro e 2 de novembro, a partir das 16h. Clique aqui e inscreva-se para participar.

Leia abaixo o texto de apresentação da curadoria:


Qual a Cor da Mentira?

Por Ezequiel Silva.

Depois de Jean-Luc Godard afirmar que o cinema é a verdade 24 vezes por segundo, o cineasta alemão Rainer Werner Fassbinder teria dito que o cinema é a mentira 24 quadros por segundo. Não se trata de escolher entre um e outro, de descobrir quem está certo ou errado, mas de aceitar a coexistência da verdade e da mentira na própria natureza da arte cinematográfica. Desde os registros pré-documentais dos irmãos Lumière e as encenações feéricas de Georges Méliès, estabeleceu-se uma tensão entre fato e fantasia, real e ilusão, prova e engano. O território é vasto demais para ser mapeado, quiçá para ser bipartido. Mais de um século se passou e o cinema continua expandindo essa fronteira, mesclando duplicidades em diferentes formas e tons, corpos e enredos. Os filmes selecionados para este ciclo investigam essa frente em que verdades e mentiras se movimentam como peças em um tabuleiro de xadrez.

Qual a Cor da Mentira?, apresentado pelo Cineclube Sganzerla entre os dias 19 de outubro e 2 de novembro, relaciona narrativas que giram em torno do casamento como forma de ressaltar essa característica essencial do cinema de espelhar as zonas acinzentadas do que é verdadeiro — até que se prove o contrário. Pois o matrimônio, assim como tantos outros pactos sociais comumente firmados no retrato da vida burguesa representado nos filmes que compõem esse programa, tenciona-se entre verdades — sobretudo as não ditas — e mentiras — especialmente as sustentadas pelo bem do status quo. Como o personagem do jornalista de A Cor da Mentira (Au Cœur du Mensonge, dir. Claude Chabrol, 1999) diz: “Graças a Deus as mentiras existem. Sem elas, seria um inferno viver em sociedade”.

Escolhido para abrir o ciclo, o longa-metragem de Chabrol, a despeito do que sugere o título, está longe de responder à pergunta levantada pela programação — ainda não é certo se a cor da mentira é azul como o vestido da esposa infiel ou vermelho como o agasalho da menina assassinada. É por isso que, seguindo os passos da atriz Joan Bennett, o espectador é convidado a explorar os tons de cinza da questão. A sessão dupla de A Mulher Desejada (The Woman on the Beach, dir. Jean Renoir, 1947) e O Segredo da Porta Fechada (Secret Beyond the Door, dir. Fritz Lang, 1947) propõe uma vertiginosa descida em espiral às profundezas do casamento heteronormativo, deixando de lado a ilusão das cores para aproximar-se ainda mais dos problemas colocados por essas fábulas ambientadas em praias isoladas e casarões góticos, habitados por maridos misteriosos — arquitetos e pintores à semelhança dos realizadores.

A viagem que começa na França e atravessa a Hollywood da década de 1940 ao lado de cineastas imigrantes, dentre eles o francês Renoir e o alemão Lang, encerra-se justamente no país deste segundo. Em Roleta Chinesa (Chinesisches Roulette, dir. Rainer Werner Fassbinder, 1976), os pais de uma jovem adolescente surpreendem-se ao encontrarem-se acompanhados dos amantes na casa de campo da família, depois de, voilá, mentir um para o outro quanto aos planos para o final de semana. O jogo da verdade que é jogado pelas personagens deste cruel teatro estilhaça a fachada do matrimônio, tão caro às convenções da burguesia, restando tão somente cacos de vidro espalhados pelo chão. Aos que arriscarem-se na tentativa de catá-los, um aviso: tomem cuidado para não se cortarem.

Programação:

19/10/2025 | 16h – Conversa sobre A Cor da Mentira (Au Cœur du Mensonge, dir. Claude Chabrol, 1999).

26/10/2025 | 16h – Sessão Joan Bennett: conversa sobre A Mulher Desejada (The Woman on the Beach, dir. Jean Renoir, 1947) e O Segredo da Porta Fechada (Secret Beyond the Door, dir. Fritz Lang, 1947).

02/11/2025 | 16h – Conversa sobre Roleta Chinesa (Chinesisches Roulette, dir. Rainer Werner Fassbinder, 1976).

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